Como Entendemos Meus Amigos a Verdadeira Humildade?

EXISTÊNCIA EXTRAORDINÁRIA

Humildade

 

Como entendemos meus amigos, a verdadeira humildade?
Ou melhor, será que já alcançamos a serenidade, o amadurecimento e a responsabilidade para entendê-la?
Falamos, respiramos e pensamos a atmosfera da transição. Queremos vivenciar, de qualquer modo, no presente, o mundo de regeneração.
Mas estaremos prontos?
Permitam-me expressar minha opinião: enquanto não aprendermos a viver a humildade, ainda não estaremos prontos.
Humildade é à base de inúmeras outras virtudes e ações que precisam ser vivenciadas neste momento para que lentamente transformemos nossos vícios e assim consigamos atingir o discernimento para vivenciar a regeneração.
Tenho pressa, pois não tenho tempo.
Não é isso o que se ouve na maioria dos dias em nossas atividades?
Nessa pressa vamos agindo por impulso, deixando que nossas emoções se transformem em sentimentos e assim guiem nossas ações, sem nos darmos contas se as emoções merecem ser cultivadas ou não.
Agindo impetuosamente não serenamos o coração e, por conseguinte não seguimos nossa vocação (“filhos de Deus, portanto de “deuses”, como Jesus nos traz no evangelho quando diz: vós soeis deuses”).
O orgulho nos impede de seguirmos o plano de Deus para nós, pois nos sentimos superiores a Ele.
Achamos que nossa vontade, nossa verdade é mais sábia. Por mais que neguemos esses fatos nossas ações nos traem quando indagamos o porquê do Pai não atender nossas preces infantis e mesquinhas.
Através do Evangelho trazido pelo Mestre Jesus temos a oportunidade de conhecer todas as verdades do Pai, e nos é feito o convite de vivermos a serenidade, a paz e o amor através da simplicidade e da humildade.
Mas, como já colocamos anteriormente, não temos tempo para amadurecer.
Assim estabelecemos guerras, ódio para implantar e viver o mundo de regeneração.
Engraçado que mais de 2000 anos se passaram e ainda mantemos o mesmo padrão de pensamentos nos achando superiores e extremamente orgulhosos de nossos feitos, como se pudéssemos ser algo sem o Eu Crístico que nos habita.
Dentro das incoerências que ainda vivemos, trazemos conceitos deturpados do que seja humildade, estabelecemos que humildade seja parte do aspecto material do ser, ou seja, significa pobreza material, inferioridade e até submissão por covardia.
O mundo é dos espertos, não é o que ouvimos?
Enquanto cristãos e espíritas temos a obrigação de entender que a humildade é a sabedoria de seguir a verdadeira realidade que é trazida em semente no nosso Eu Crístico.
Humildade, meus amigos, é não exaltar as virtudes que imaginamos ter, ou que gostaríamos de ter. Nem muito menos é se fazer de coitado, não valorizando o longo caminho de aprendizado e as virtudes conquistadas.
Humildade é dar o valor exato para cada momento, cada situação, cada talento e a vocação que nos é confiada.
Ser humilde é ter a capacidade de procurar-se a si mesmo e se encontrar como Filho de Deus, sendo Um com todos no Pai.
Não somos nem mais, nem menos que os outros, somos apenas nós mesmos com uma missão única.
Por isso dizemos que apesar da unidade com o Pai, nunca deixamos de termos nossas particularidades. São as particularidades que fazem o Todo (UM) muito mais perfeito e complexo.
Amigos os exorto a exercitarem a humildade, afim de que com serenidade, esperança e responsabilidade, possam ser eternos aprendizes na seara do Bem, caminhando para a regeneração de nossos espíritos.
Deixo um abraço com a certeza de que todos somos Um nesta longa jornada.

 

Em 10/06/2014 – Médium: Lúcia
Espírito: Irmão Matheus (Colônia Espiritual Maria de Nazaré).
Arte: Carlos Antônio Oliveira (Equipe Luz Espírita).

primeiro lugar
apaixonado

Bem-aventurados os que Têm Fechados os Olhos

 

Meus bons amigos, para que me chamastes? Terá sido para que eu imponha as mãos sobre a pobre sofredora que está aqui e a cure? Ah! que sofrimento, bom Deus! Ela perdeu a vista e as trevas a envolveram. Pobre filha! Que ore e espere. Não sei fazer milagres, eu, sem que Deus o queira. Todas as curas que tenho podido obter e que vos foram assinaladas não as atribuais senão àquele que é o Pai de todos nós. Nas vossas aflições, volvei sempre para o céu o olhar e dizei do fundo do coração: “Meu Pai, cura-me, mas faze que minha alma enferma se cure antes que o meu corpo; que a minha carne seja castigada, se necessário, para que minha alma se eleve ao teu seio, com a brancura que possuía quando a criaste.” Após essa prece, meus amigos, que o bom Deus ouvirá sempre, dadas vos serão a força e a coragem e, quiçá, também a cura que apenas timidamente pedistes, em recompensa da vossa abnegação.
Contudo, uma vez que aqui me acho, numa assembléia onde principalmente se trata de estudos, dir-vos-ei que os que são privados da vista deveriam considerar-se os bem-aventurados da expiação. Lembrai-vos de que o Cristo disse convir que arrancásseis o vosso olho se fosse mau, e que mais valeria lançá-lo ao fogo, do que deixar se tornasse causa da vossa condenação. Ah! quantos há no mundo que um dia, nas trevas, maldirão o terem visto a luz! Oh! sim, como são felizes os que, por expiação, vêm a ser atingidos na vista! Os olhos não lhes serão causa de escândalo e de queda; podem viver inteiramente da vida das almas; podem ver mais do que vós que tendes límpida a visão!… Quando Deus me permite descerrar as pálpebras a algum desses pobres sofredores e lhes restituir a luz, digo a mim mesmo: Alma querida, por que não conheces todas as delicias do Espírito que vive de contemplação e de amor? Não pedirias, então, que se te concedesse ver imagens menos puras e menos suaves, do que as que te é dado entrever na tua cegueira!
Oh! bem-aventurado o cego que quer viver com Deus. Mais ditoso do que vós que aqui estais, ele sente a felicidade, toca-a, vê as almas e pode alçar-se com elas às esferas espirituais que nem mesmo os predestinados da Terra logram divisar. Abertos, os olhos estão sempre prontos a causar a falência da alma; fechados, estão prontos sempre, ao contrário, a fazê-la subir para Deus. Crede-me, bons e caros amigos, a cegueira dos olhos é, muitas vezes, a verdadeira luz do coração, ao passo que a vista é, com freqüência, o anjo tenebroso que conduz à morte.
Agora, algumas palavras dirigidas a ti, minha pobre sofredora. Espera e tem ânimo! Se eu te dissesse: Minha filha, teus olhos vão abrir-se, quão jubilosa te sentirias! Mas, quem sabe se esse júbilo não ocasionaria a tua perda! Confia no bom Deus, que fez a ventura e permite a tristeza. Farei tudo o que me for consentido a teu favor; mas, a teu turno, ora e, ainda mais, pensa em tudo quanto acabo de te dizer.
Antes que me vá, recebei todos vós, que aqui vos achais reunidos, a minha bênção. – Vianney, cura d’Ars. (Paris, 1863.)
NOTA. Esta comunicação foi dada com relação a uma pessoa cega, a cujo favor se evocara o Espírito de J. B. Vianney, cura d’Ars.
NOTA. Quando uma aflição não é conseqüência dos atos da vida presente, devese- lhe buscar a causa numa vida anterior. Tudo aquilo a que se dá o nome de caprichos da sorte mais não é do que efeito da justiça de Deus, que não inflige punições arbitrárias pois quer que a pena esteja sempre em correlação com a falta. Se, por sua bondade, lançou um véu sobre os nossos atos passados, por outro lado nos aponta o caminho, dizendo: ‘“Quem matou à espada, pela espada perecerá”, palavras que se podem traduzir assim: “A criatura é sempre punida por aquilo em que pecou.” Se, portanto, alguém sofre o tormento da perda da vista, é que esta lhe foi causa de queda. Talvez tenha sido também causa de que outro perdesse a vista; de que alguém haja perdido a vista em conseqüência do excesso de trabalho que aquele lhe impôs, ou de maus-tratos, de falta de cuidados, etc. Nesse caso, passa ele pela pena de talião. É possível que ele próprio, tomado de arrependimento, haja escolhido essa expiação, aplicando a si estas palavras de Jesus: “Se o teu olho for motivo de escândalo, arranca-o.”

 

KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. FEB. Capítulo 8. Itens 20 e 21.

saudade e dor

Em Favor dos Enfermos

 

Na grande área dos serviços fraternais de socorro ao próximo, demandando a ação da caridade, a cura das mazelas orgânicas, emocionais e mentais é de vital importância.
Certamente, mais delicado é o desafio da saúde moral, graças ao qual os fenômenos fisiopsíquicos assumem alta significação, apresentando-se como respostas inevitáveis.
O ideal, portanto, é trabalhar-se os valores íntimos do homem, de cuja harmonia deriva o bem-estar. Entretanto, na impossibilidade de conseguir-se a realização plena, no campo das causas, o empenho por minimizar-se os efeitos perniciosos assume significação relevante, por propiciar requisitos que facultam a instalação das fontes saudáveis na organização perispiritual.
Para que se logrem resultados favoráveis na terapia curativa, é indispensável que o agente possua condições mínimas que sejam, a saber: harmonia interior, que decorre de uma conduta sadia; sentimentos de amor, que propiciem vibrações positivas; espírito de abnegação; saúde física e mental, de modo que a bioenergia, que se deseje doar, carreie forças restauradoras e atue nos centros vitais, gerando células sãs, portadoras de equipamentos harmônicos.
Ocorre, às vezes, que alguns instrumentos das curas contradizem esses itens mínimos, porém, eles próprios são pacientes, nos quais as enfermidades ainda não se manifestaram, apesar de já instaladas.
Agem para o bem, sem consciência do que lhes pode fazer bem.
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Toda e qualquer pessoa forrada de bons propósitos pode e deve auxiliar o seu próximo, quando enfermo.
Não é exigível que aplique esta ou aquela técnica, sempre dispensável. Mas é essencial que se haja educado para o mister e procure, sinceramente, ajudar.
A irradiação da mente concentrada no bem, em favor de alguém, opera admiráveis resultados.
Unida à aplicação dessa energia, com as mãos distendidas, sem ruído ou ritual, a magnetização da água completa a operação socorrista, ao ser ingerida pelo paciente.
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A sociedade, como um todo, necessita do equilíbrio e da saúde, no entanto, é no homem, como célula valiosa, que se deve iniciar o labor terapêutico.
É claro que muitos atletas, portadores de saúde física, são, por outro lado, expressões de conduta infeliz, perniciosa.
Os apologistas das raças superiores preocupam-se com os físicos ideais e portadores de linhas que expressem a procedência genética, despreocupados com os seus valores éticos e morais.
A saúde real é resultado da homeostase, vigente no homem, na qual o físico e o emocional se harmonizam perfeitamente.
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Jesus curava e concedeu aos discípulos a faculdade de recuperar os enfermos.
Mantinha, no entanto, uma regra severa para a preservação da saúde, que era a recomendação em favor da conduta moral de modo que não lhes acontecesse nada pior.
A mente é fonte geradora de energias que esparze conforme as inclinações do espírito, sendo fator de infortúnio, como de felicidade, para si mesmo e para os demais.
Assim, orando, exercita os teus recursos latentes, canalizando-os em favor dos enfermos e recomendando-lhes mudanças de comportamento mental e moral para melhor, assim contribuindo para que a sociedade humana seja mais feliz.

 

FRANCO, Divaldo Pereira. Momentos de Felicidade. Pelo Espírito Joanna de Ângelis. 4.ed. LEAL, 2011. Capítulo 8.

eu sou jesus
plantas

Alguém Deve Plantar

 

“Eu plantei, Apolo regou, mas o crescimento veio de Deus”. Paulo (I Corintios, 3:6.)
Nada de personalismo dissolvente na lavoura do Espírito.
Qual ocorre em qualquer campo terrestre, cultivador algum, na gleba da alma, pode jactar-se de tudo fazer nos domínios da sementeira ou da colheita.
Após o esforço de quem plantam, há quem siga o vegetal nascente, quem o auxilie, quem o corrija, quem o proteja.
Pensando, porém, no impositivo da descentralização, no serviço espiritual, muitos companheiros fogem à iniciativa nas construções de ordem moral que nos competem. Muitos deles, convidados a compromissos edificantes, nesse ou naquele setor de trabalho, afirmam-se inaptos para a tarefa, como se nunca devêssemos iniciar o aprendizado do aprimoramento íntimo, enquanto que outros asseveram, quase sempre com ironia, que não nasceram para líderes. Os que assim procedem costumam relegar para DEUS comezinhas obrigações no que tange à elevação, progresso, acrisolamento, ou melhoria, mas as leis do CRIADOR não isentam a criatura do dever de colaborar na edificação do bem e da verdade, em favor de si mesma.
Vejamos a palavra do Apóstolo Paulo, quando já conhecia os problemas do auto-aperfeiçoamento, em nos referindo à evangelização: “Eu plantei, Apolo regou, mas o crescimento veio de Deus”.
A necessidade do devotamento individual à causa da verdade transparece, clara, de semelhante conceituação.
Sabemos que a essência de toda atividade, numa lavra agrícola, procede, originariamente, da Providência Divina.
De DEUS vem a semente, o solo, o clima, a seiva e a orientação para o desenvolvimento da árvore, como também dimanam de DEUS a inteligência, a saúde, a coragem e o discernimento do cultivador, mas somos obrigados a reconhecer que alguém deve plantar.

 

XAVIER, Francisco Cândido. Segue-me!… Pelo Espírito Emmanuel. O Clarim.

experiência chico xavier

edificação

Não vim trazer a paz, mas, a divisão

 

Não penseis que eu tenha vindo trazer paz à Terra; não vim trazer a paz, mas a espada; – porquanto vim separar de seu pai o filho, de sua mãe a filha, de sua sogra a nora; – e o homem terá por inimigos os de sua própria casa.
(S. MATEUS, cap. X, vv. 34 a 36.)
Vim para lançar fogo à Terra; e que é o que desejo senão que ele se acenda? – Tenho de ser batizado com um batismo e quanto me sinto desejoso de que ele se cumpra!
Julgais que eu tenha vindo trazer paz à Terra? Não, eu vos afirmo; ao contrário, vim trazer a divisão; – pois, doravante, se se acharem numa casa cinco pessoas, estarão elas divididas umas contra as outras: três contra duas e duas contra três. – O pai estará em divisão com o filho e o filho com o pai, a mãe com a filha e a filha com a mãe, a sogra com a nora e a nora com a sogra. (S. LUCAS, cap. XII, vv. 49 a 53.)
Será mesmo possível que Jesus, a personificação da doçura e da bondade, Jesus, que não cessou de pregar o amor do próximo, haja dito: “Não vim trazer a paz, mas a espada; vim separar do pai o filho, do esposo a esposa; vim lançar fogo à Terra e tenho pressa de que ele se acenda”? Não estarão essas palavras em contradição flagrante com os seus ensinos? Não haverá blasfêmia em lhe atribuírem a linguagem de um conquistador sanguinário e devastador? Não, não há blasfêmia, nem contradição nessas palavras, pois foi mesmo ele quem as pronunciou, e elas dão testemunho da sua alta sabedoria. Apenas, um pouco equivoca, a forma não lhe exprime com exatidão o pensamento, o que deu lugar a que se enganassem relativamente ao verdadeiro sentido delas. Tomadas à letra, tenderiam a transformar a sua missão, toda de paz, noutra de perturbação e discórdia, conseqüência absurda, que o bom-senso repele, porquanto Jesus não podia desmentir-se. (Cap. XIV, no 6.)
Toda ideia nova forçosamente encontra oposição e nenhuma há que se implante sem lutas. Ora, nesses casos, a resistência é sempre proporcional à importância dos resultados previstos, porque, quanto maior ela é, tanto mais numerosos são os interesses que fere. Se for notoriamente falsa, se a julgam isenta de conseqüências, ninguém se alarma; deixam-na todos passar, certos de que lhe falta vitalidade. Se, porém, é verdadeira, se assenta em sólida base, se lhe preveem futuro, um secreto pressentimento adverte os seus antagonistas de que constitui uni perigo para eles e para a ordem de coisas em cuja manutenção se empenham. Atiram-se, então, contra ela e contra os seus adeptos.
Assim, pois, a medida da importância e dos resultados de uma ideia nova se encontra na emoção que o seu aparecimento causa, na violência da oposição que provoca, bem como no grau e na persistência da ira de seus adversários.
Jesus vinha proclamar uma doutrina que solaparia pela base os abusos de que viviam os fariseus, os escribas e os sacerdotes do seu tempo. Imolaram-no, portanto, certos de que, matando o homem, matariam a ideia. Esta, porém, sobreviveu, porque era verdadeira; engrandeceu-se, porque correspondia aos desígnios de Deus e, nascida num pequeno e obscuro burgo da Judéia, foi plantar o seu estandarte na capital mesma do mundo pagão, à face dos seus mais encarniçados inimigos, daqueles que mais porfiavam em combatê-la, porque subvertia crenças seculares a que eles se apegavam muito mais por interesse do que por convicção. Lutas das mais terríveis esperavam aí pelos seus apóstolos; foram inumeráveis as vítimas; a ideia, no entanto, avolumou-se sempre e triunfou, porque, como verdade, sobrelevava as que a precederam.
É de notar-se que o Cristianismo surgiu quando o Paganismo já entrara em declínio e se debatia contra as luzes da razão. Ainda era praticado pro forma; a crença, porém, desaparecera; apenas o interesse pessoal o sustentava. Ora, é tenaz o interesse; jamais cede à evidência; irrita-se tanto mais quanto mais peremptórios e demonstrativos de seu erro são os argumentos que se lhe opõem. Sabe ele muito bem que está errado, mas isso não o abala, porquanto a verdadeira fé não lhe está na alma. O que mais teme é a luz, que dá vista aos cegos. É-lhe proveitoso o erro; ele se lhe agarra e o defende.
Sócrates, também, não ensinara uma doutrina até certo ponto análoga à do Cristo? Por que não prevaleceu naquela época a sua doutrina, no seio de um dos povos mais inteligentes da Terra? É que ainda não chegara o tempo. Ele semeou numa terra não lavrada; o Paganismo ainda se não achava gasto. O Cristo recebeu em propício tempo a sua missão. Muito faltava, é certo, para que todos os homens da sua época estivessem à altura das idéias cristãs, mas havia entre eles uma aptidão mais geral para as assimilar, pois que já se começava a sentir o vazio que as crenças vulgares deixavam na alma. Sócrates e Platão haviam aberto o caminho e predisposto os espíritos. (Veja-se, na “Introdução”, o § IV: Sócrates e Platão, precursores da ideia cristã e do Espiritismo.)
Infelizmente, os adeptos da nova doutrina não se entenderam quanto à interpretação das palavras do Mestre, veladas, as mais das vezes, pela alegoria e pelas figuras da linguagem. Daí o nascerem, sem demora, numerosas seitas, pretendendo todas possuir, exclusivamente, a verdade e o não bastarem dezoito séculos para pô-las de acordo. Olvidando o mais importante dos preceitos divinos, o que Jesus colocou por pedra angular do seu edifício e como condição expressa da salvação: a caridade, a fraternidade e o amor do próximo, aquelas seitas lançaram anátema umas sobre as outras, e umas contra as outras se atiraram, as mais fortes esmagando as mais fracas, afogando-as em sangue, aniquilando-as nas torturas e nas chamas das fogueiras. Vencedores do Paganismo, os cristãos, de perseguidos que eram, fizeram-se perseguidores. A ferro e fogo foi que se puseram a plantar a cruz do Cordeiro sem mácula nos dois mundos. E fato constante que as guerras de religião foram as mais cruéis, mais vítimas causaram do que as guerras políticas; em nenhumas outras se praticaram tantos atos de atrocidade e de barbárie.
Cabe a culpa à doutrina do Cristo? Não, decerto, que ela formalmente condena toda violência. Disse ele alguma vez a seus discípulos: Ide, matai, massacrai, queimai os que não crerem como vós? Não; o que, ao contrário, lhes disse, foi: Todos os homens são irmãos e Deus é soberanamente misericordioso; amai o vosso próximo; amai os vossos inimigos; fazei o bem aos que vos persigam. Disse-lhes, outrossim: Quem matar com a espada pela espada perecerá. A responsabilidade, portanto, não pertence à doutrina de Jesus, mas aos que a interpretaram falsamente e a transformaram em instrumento próprio a lhes satisfazer às paixões; pertence aos que desprezaram estas palavras: “Meu reino não é deste mundo.”
Em sua profunda sabedoria, ele tinha a previdência do que aconteceria. Mas, essas coisas eram inevitáveis, porque inerentes à inferioridade da natureza humana, que não podia transformar-se repentinamente. Cumpria que o Cristianismo passasse por essa longa e cruel prova de dezoito séculos, para mostrar toda a sua força, visto que, mau grado a todo o mal cometido em seu nome, ele saiu dela puro. Jamais esteve em causa. As invectivas sempre recaíram sobre os que dele abusaram. A cada ato de intolerância, sempre se disse: Se o Cristianismo fosse mais bem compreendido e mais bem praticado, isso não se daria.
Quando Jesus declara: “Não creais que eu tenha vindo trazer a paz, mas, sim, a divisão”, seu pensamento era este:
“Não creais que a minha doutrina se estabeleça pacificamente; ela trará lutas sangrentas, tendo por pretexto o meu nome, porque os homens não me terão compreendido, ou não me terão querido compreender. Os irmãos, separados pelas suas respectivas crenças, desembainharão a espada um contra o outro e a divisão reinará no seio de uma mesma família, cujos membros não partilhem da mesma crença. Vim lançar fogo à Terra para expungi-la dos erros e dos preconceitos, do mesmo modo que se põe fogo a um campo para destruir nele as ervas más, e tenho pressa de que o fogo se acenda para que a depuração seja mais rápida, visto que do conflito sairá triunfante a verdade. A guerra sucederá a paz; ao ódio dos partidos, a fraternidade universal; às trevas do fanatismo, a luz da fé esclarecida. Então, quando o campo estiver preparado, eu vos enviarei o Consolador, o Espírito de Verdade, que virá restabelecer todas as coisas, isto é, que, dando a conhecer o sentido verdadeiro das minhas palavras, que os homens mais esclarecidos poderão enfim compreender, porá termo â luta fratricida que desune os filhos do mesmo Deus. Cansados, afinal, de um combate sem resultado, que consigo traz unicamente a desolação e a perturbação até ao seio das famílias, reconhecerão os homens onde estão seus verdadeiros interesses, com relação a este mundo e ao outro. Verão de que lado estão os amigos e os inimigos da tranqüilidade deles. Todos então se porão sob a mesma bandeira: a da caridade, e as coisas serão restabelecidas na Terra, de acordo com a verdade e os princípios que vos tenho ensinado.”
O Espiritismo vem realizar, na época prevista, as promessas do Cristo. Entretanto, não o pode fazer sem destruir os abusos. Como Jesus, ele topa com o orgulho, o egoísmo, a ambição, a cupidez, o fanatismo cego, os quais, levados às suas últimas trincheiras, tentam barrar-lhe o caminho e lhe suscitam entraves e perseguições.
Também ele, portanto, tem de combater; mas, o tempo das lutas e das perseguições sanguinolentas passou; são todas de ordem moral as que terá de sofrer e próximo lhes está o termo. As primeiras duraram séculos; estas durarão apenas alguns anos, porque a luz, em vez de partir de um único foco, irrompe de todos os pontos do Globo e abrirá mais de pronto os olhos aos cegos.
Essas palavras de Jesus devem, pois, entender-se com referência às cóleras que a sua doutrina provocaria, aos conflitos momentâneos a que ia dar causa, às lutas que teria de sustentar antes de se firmar, como aconteceu aos hebreus antes de entrarem na Terra Prometida, e não como decorrentes de um desígnio premeditado de sua parte de semear a desordem e a confusão. O mal viria dos homens e não dele, que era como o médico que se apresenta para curar, mas cujos remédios provocam uma crise salutar, atacando os maus humores do doente.
KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. FEB. Capítulo 23. Itens 9 a 18.

destino do sofrimento
espiritualidade

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